Corpo humano guarda marcas e memórias das nossas vivências. Precisamos decifrá-las para transformá-las de maneira assertiva
Temos memória corporal desde antes do nosso nascimento. Na barriga de nossas genitoras, experimentamos sensações e vivências que, ao longo do tempo, vão se transformando em lembranças. O bebê no útero não fica parado. Muito pelo contrário. Ele é um ser ativo que explora o ambiente, brinca, suga os dedos, sonha, chora, sorri e experimenta emoções.
Todo esse aprendizado do ser humano, que começa na barriga e gradualmente vai se aprimorando conforme crescemos, torna-se a base para o nosso desenvolvimento cognitivo, emocional/afetivo e motor.
O corpo guarda marcas e memórias das nossas vivências. Algumas delas não conseguimos nos lembrar na vida adulta. Se as experiências foram boas, guardamos sensações de leveza e lidamos com o mundo externo, na maior parte do tempo, de forma aberta, alegre, criativa e espontânea.
Agora, se experimentamos ao longo da vida uma série de traumas e violência, as emoções ficam reprimidas e bloqueadas, causando tensões e reações somáticas.
Desta forma, o trabalho corporal se torna uma ferramenta importante, que possibilita a soltura e a liberação de emoções reprimidas, ou seja, aquelas que nos impedem de termos uma vida plena e mais feliz, dando voz ao que, muitas vezes, não conseguimos expressar por palavras.
Benefícios podem ser experimentados ao conseguirmos aliar práticas que fortalecem a conexão entre a mente e corpo. Isso porque alguns sintomas físicos não têm causas aparentes.
Práticas que permitem a respiração de forma consciente, conectando com o momento presente, proporcionam uma resposta do sistema nervoso autônomo. Falamos de atividades como yoga, meditação, dança e diversos tipos de massagens. Tais ações podem contribuir para equilibrar respostas emocionais e reduzir o estresse e ansiedade.
As massagens com toques sutis têm uma resposta direta no sistema nervoso central. As pessoas que sofreram traumas e violências podem ter impactos negativos na autoestima, autoconfiança e autoimagem. Podem experimentar também uma perda de autonomia e de senso de controle sobre seus corpos e emoções.
O trabalho com o corpo pode ajudar no resgate do empoderamento, na criação de um espaço seguro para as pessoas se expressarem livremente, sem julgamentos, e no aumento da resiliência emocional para lidar melhor com os desafios da vida.
Dois aspectos importantes que o trabalho corporal permite abordar são a prevenção da violência e a da revitimização. Muitas pessoas que sofreram traumas podem se “auto abusar” ou se tornarem abusadoras no futuro. Ao desenvolverem uma consciência sobre si mesmas, suas necessidades e potencialidades, elas conseguem identificar sinais e gatilhos de estresse ou desequilíbrio emocional, antes que isso se manifeste em comportamentos violentos. Assim, há como mudar a resposta frente a esses estímulos.
Cada pessoa é um indivíduo único e responde aos tratamentos de diversas formas, o que pode funcionar para um nem sempre funciona para o outro. O importante é o autocuidado e encontrar uma prática que melhor se adeque às suas próprias necessidades.
É importante salientar que os trabalhos corporais não substituem a psicoterapia tradicional, especialmente em casos de traumas mais graves.
No entanto, eles podem ser aliados como parte de um plano de tratamento mais abrangente para traumas e prevenção da violência.
O Núcleo Espiral é uma Organização Social comprometida com a assistência e prevenção da violência contra crianças e adolescentes. O objetivo é educar e conscientizar a população sobre a prática da violência e tratamento degradante contra a pessoa humana, em especial, a criança e o adolescente.
Dois dos pilares mais importantes do Método Espiral é o corpo e a resiliência. Para isso, são realizadas oficinas socioeducativas, incluindo atividades corporais, a fim de ressignificar vivências traumáticas anteriores.
A partir da construção de um terreno seguro e de confiança, as crianças e os adolescentes são capazes de explorar seus potenciais e descobrir novas formas de ser e estar no mundo, sem precisar fazer uso das violências que os cercam.
Autora: Alessandra Sekiguti Psicóloga pela Universidade Guarulhos e Pós-graduada pelo Mackenzie em Gestão de RH. Psicóloga da Área de Assistência Psicológica no Núcleo Espiral.